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Como ser um "consumidor consciente"?



Neste post, gostaria de propor o exercício de imaginar qual foi o caminho percorrido por um produto que você comprou, fez para chegar até sua casa ou empresa. Eu não me refiro somente ao transporte da loja ou da fábrica até a sua casa, e sim toda a cadeia logística, produtiva e extrativista, pelo qual este produto passou. Desde a obtenção dos insumos primários (minério de ferro, petróleo, substratos naturais, etc..), passando por toda a cadeia produtiva, sem esquecer dos diversos modais de transporte, até chegar em você.


Neste exercício de imaginação, você conseguiria afirmar que em nenhum momento desta longa cadeia, este produto financiou algum tipo de desmatamento ilegal? Causou danos ambientais irreparáveis durante a extração de seus insumos primários? Foi fruto de algum tipo de trabalho escravo ou análogo à escravidão, ou mesmo mão de obra infantil, ou desrespeitou alguma legislação trabalhista?


Podemos pensar que isso não é um problema nosso, ou que somos apenas uma "formiguinha", e não temos como influenciar no resultado global. De acordo com o Prof. Yuval Noah Harari, em seu livro "Sapiens: Uma breve história da humanidade", a nossa espécie é a única na história do planeta, que foi capaz de modificar o ambiente, mais rápido do que o ambiente pode se adaptar às nossas mudança. Além disso, passamos de uma espécie que se alimentava de tutano dos ossos do que sobrava da caça de outros animais maiores, para seres capazes de modificar a genética de animais que nos servirão de comida. Nenhuma outra espécie (animal ou vegetal), foi capaz de tanto em tão pouco tempo.


É claro que tudo isso foi positivo, e ninguém quer voltar ao tempo em que nos contentávamos em comer tutano de carcaças abandonadas, com medo de ser atacado por um animal maior, no meio de uma savana na África. Isso seria impensável. Porem precisamos nos conscientizar, que somos a espécie capaz de produzir as maiores modificações no planeta (negativas ou positivas).


Atualmente a humanidade consome 30% mais recursos naturais do que a capacidade de renovação da terra. Se os padrões de consumo e produção se mantiverem, em menos de uma geração, precisaremos de duas terras para nos manter.


Ainda segundo Yuval Harari, o provável motivo que transformou a espécie sapiens na espécie dominante da terra, foi nossa capacidade peculiar de comunicação, sofisticada ao ponto de nos capacitar para imaginar o intangível, comunicar o intangível para o próximo e criar "fabulas" que nos fazem cooperar pelo bem comum, através de regras, normas, leis e crenças.


Cadeias longas de produção, representam muito da incrível capacidade da espécie humana se organizar e realizar grandes feitos. Cadeias longas, possibilitam a produção de bens de alta tecnologia, afinal de contas, se você está lendo este post em um computador ou smartphone, saiba que ele é fruto de uma gigantesca cadeia global de manufatura, ou você realmente acredita que uma única empresa, seja capaz de produzir um computador sozinha (extração dos minérios, fabricação dos chips, processadores, memórias, partes injetadas, produção dos polímeros, programação de todos os softwares, etc...)?


O que eu quero apresentar aqui, é que não é possível (como sapiens, que somos), viver sem o consumo. Sem o consumo, na "crença" no dinheiro, organizações, empresas e governo, seria impossível dominarmos o planeta, afinal, se dependêssemos da lei do mais forte, certamente perderíamos esta luta.


E é neste ponto que entra o "consumidor consciente", aceitando que o consumo é necessário, mas que precisamos nos responsabilizar pelos impactos gerados no planeta e nas comunidades, a prática do consumo consciente tem se mostrado como resposta aos desafios desta geração. Porem, da mesma forma que é impossível um único ser humano deter todo o conhecimento necessário para produzir um determinado produto, também é impossível "monitorar" toda a cadeia produtiva. Para isso, precisamos recorrer à mesma engenhosidade, que fez do homo sapiens a espécie dominante da terra e sairmos desse "beco" em que nos metemos.


A pessoa que vos escreve este texto, está longe de ser um acadêmico generalista, muito pelo contrário, sou uma pessoa altamente especializada em uma pequena parte da cadeia produtiva de um grupo bem específico de produtos (móveis e cadeiras para escritório), mas como um sapiens colaborador que sou, quero (usando a capacidade de comunicação), mostrar alguns caminhos que podemos trilhar, para nos tornarmos consumidores mais conscientes, pelo menos destes produtos, (mobiliário corporativo).


Um bom roteiro para começarmos, é comprar somente de empresas legalmente constituídas, que emitem nota fiscal e estão de acordo com as leis dos locais em que operam a sua produção e comercialização. Este passo, pode até parecer meio óbvio, mas acredite, ainda é pratica comum no mercado de móveis residenciais, a não emissão de nota fiscal. Você sempre lembra de pedir nota fiscal para o seu marceneiro?


Podemos não concordar com os governantes e achar a carga tributária do país extremamente alta, mas acredite em mim, a sonegação (além de ser crime), só aumenta a carga tributária, afinal de contas, alguém vai sempre pagar esta conta, não é mesmo? O melhor caminho para corrigir a carga tributária do país é pelo voto e não pela sonegação.


Pode até parecer algo inocente, deixar de emitir uma simples nota fiscal, o que um simples documento interfere no consumo consciente?


A resposta é simples: Se uma empresa não emite nota, logo ela está a margem de fiscalizações, concorda? Se a empresa não sofre fiscalização, o que a impede de não registrar seus funcionários, não cuidar dos resíduos gerados em seu processo, usar mão de obra infantil e não providenciar equipamentos de proteção individual e coletivos, que protejam seus colaboradores e a comunidade em seu entorno, com aplicação de filtros, coletores de pó e armazenamento adequado de produtos tóxicos ou explosivos, por exemplo?


Um segundo passo, que podemos facilmente seguir, e dar preferência para empresas que possuem algum selo ambiental, e ou certificações ambientais. Existem diversas entidades ligadas ou não à governos que realizam este trabalho. Produtos que tem este tipo de selo, recebem a certificação, após um longo processo, realizado por meio de auditorias externas e internas, garantindo que a empresa atua de maneira responsável e sustentável ao longo de todo o seu processo produtivo, bem como garante que a empresa somente adquira insumos de fornecedores que também possuem este tipo de certificação, que por sua vez garante que o fornecedor do fornecedor do fornecedor, também possua este tipo de selo.


Trazendo para o mundo dos "móveis para escritório", significa que o fabricante dos móveis, que tem o selo de "madeira reflorestada" (usando somente o exemplo da madeira), além de ser auditado pela certificadora, garantindo que o seu processo está de acordo com as regras ambientais e respeita as leis, só pode comprar madeira, de fabricantes certificados. O fabricante da madeira, por sua vez, também é obrigado a respeitar todas as mesmas premissas da fábrica dos móveis, e para que o fabricante da madeira (em chapa) possa manter a sua certificação, ele só pode comprar a madeira bruta (árvore cortada), de madeireiras certificadas, e para que estas madeireiras possam manter a certificação, eles só podem cortar árvores oriundas de reflorestamento com manejo sustentável.


Percebeu que o simples ato, de você consumidor final, exigir que o móvel que está comprando possua algum tipo de certificação ambiental, forçou que toda a longa cadeia também seja sustentável do ponto de vista ambiental? Perceba também, que se você (o consumidor final) não considerar que a compra de produtos com certificado de origem seja importante, faz com que toda a cadeia produtiva, também deixe de considerar tudo isso importante?


Um terceiro passo, que pode parecer não guardar nenhuma relação com o consumo consciente, é a preocupação com a qualidade.


Vamos imaginar a seguinte situação:


Você está buscando uma cadeira boa bonita e barata para você, e está na dúvida entre duas opções: A primeira cadeira custa R$ 200,00 e tem 3 meses de garantia. A segunda cadeira, custa R$ 450,00 e tem 6 anos de garantia. A primeira opção parece ser mais interessante, afinal de contas, ser um consumidor consciente, também é cuidar do bolso, não é mesmo?


Porem, se esta cadeira, com sorte durar um ano (o que é pouco provável), enquanto a segunda cadeira ainda estiver na garantia, você já terá comprado pelo menos mais 5 da primeira. Em um mundo onde muitos fabricantes ainda tem em seu modelo de negócio, a famosa "obsolescência programada", como fonte de lucro, quando você opta pela primeira cadeira, estará comprometendo a sua saúde financeira, e a do planeta. Afinal de contas, se a cadeira for "descartável", estaremos multiplicando por 5x a quantidade de insumos extraídos da natureza, bem como multiplicando por 5x a quantidade de resíduos gerados. Sem falar que no final, você terá gastado mais, engordando o bolso de empresários que não se preocupam com o planeta, nem no bem estar social, afinal de contas, produtos melhores, exigem profissionais melhores e melhores salários, que por sua vez, contribuem com a melhora da sociedade como um todo.


Existem outros passos que podem ser seguidos para nos tornarmos consumidores mais conscientes, mas acredito que estes sejam os primeiros e mais importantes passos, em especial quando olhamos para o aspecto ambiental e sustentável do consumo.


As vezes, temos a sensação que não podemos fazer muito, porem quando o assunto é sustentabilidade, como consumidores, somos o menor, porem mais importante elo desta longa cadeia.



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